Introdução à Qabbalah/Kabbala/Cabala Hermética: Como Funciona Magia com as Sephiroth
- Tami Saturni 🪐
- 21 de ago.
- 11 min de leitura
“O inconsciente coletivo consiste da soma dos instintos e seus correlatos, os arquétipos. Assim como todo o mundo possui instintos, também possui um estoque de imagens arquetípicas.”
– Carl Jung
Os blocos fundamentais da realidade: as Sephiroth, a.k.a. Arquétipos, da Qabalah Mística
A palavra “arquétipo” encontra suas raízes etimológicas no grego árkhō (começar) e túpos (tipo). Na filosofia platônica, o conceito se refere às Formas que existem no Mundo das Ideias e que dão origem a tudo o que existe aqui.
Por exemplo: existem vários tipos de cadeiras, mas todas elas têm determinadas características, como assento, encosto e pernas - características estas que descendem da Cadeira Ideal.
Dentro do arcabouço junguiano, o termo se refere aos blocos fundamentais do inconsciente coletivo. Tratam-se, basicamente, de ideias universais e herdadas, bem como padrões de pensamento e imagens que residem nos recônditos de nossas psiques.
Dentro da teoria de Jung, alguns arquétipos incluem:
A Mãe, que ama, nutre e protege. Que gera a vida com o próprio corpo. A matrix da vida - como a Mãe Terra.
O Trickster, personagem disruptivo que quebra as regras e desafia convenções, às vezes com humor.
O Herói, que, valentemente, busca a si próprio em jornadas arriscadas e que muitas vezes demandam sacrifício.
Anima/Animus, os aspectos feminino e masculino que existem em cada um.
Arquétipos são transculturais, com temas recorrentes ao redor do tempo e do espaço. Por exemplo: qualquer cultura que você explorar vai apresentar uma jornada do herói, seja este Enkidu, Hércules ou Frodo.
Além disso, são simbólicos, pois suas conotações em muito transcendem a sua literalidade. Ainda no exemplo do herói, seus temas simbólicos incluem o amadurecimento e o serviço ao coletivo, e não só a vitória.
A jornada do herói representa um padrão arquetípico, bem como lendas de criação e amantes desafortunados. Padrões arquetípicos falam sobre experiências humanas que transcendem o tempo e o espaço. Pense Big Bang e Romeu e Julieta.
Arquétipos podem ser ativados com o fim de fomentar seu processo de individuação, ou seja, sua busca por Eudaimonia. Isso ocorre quando você os traz à tona para o consciente. Para tanto, você pode lançar mão de diversos recursos, tais quais: visualização, emprego de símbolos, arte, afirmações e meditações.
Neste momento, a Astrologia pode ser uma valiosa aliada, pois se trata de uma linguagem arquetípica. Uma exploração dos mitos relacionados às constelações e planetas, bem como de estrelas fixas relacionadas ao seu mapa natal, pode trazer uma nova visão sobre sua personalidade e sua vida.
A beleza do Hermetismo é que as correspondências funcionam não importa como você fatie o sistema. Nós iremos explorar Tarot e Astrologia mais à frente, mas eu achei adequado iniciar nossos estudos arquetípicos pela Qabbalah.
Qabalah Mística: Conexão com os Fundamentos da Realidade
A Qabbalah Mística é um sistema espiritual baseado em textos hebraicos como o Zohar e o Sepher Yetzirah. Trata-se de uma abordagem de evolução espiritual por meio da compreensão do Universo, bem como de práticas de visualização e meditação. Isto se dá por meio da elevação das próprias energias, assim como da sincronização com energias cósmicas.
Um dos seus pilares é a Árvore da Vida, um glifo que representa, a um só tempo, o mapa do universo e da alma humana - como acima, assim abaixo. Dion Fortune, autora do clássico A Qabalah Mística, a chama de yoga do ocidente. Para mim, a ideia faz muito sentido, pois faz-se fundamental, pelas suas correspondências com Tarot e Astrologia, a qualquer estudante de ocultismo ocidental.
Os Quatro Mundos
O pensamento qabalístico se dá dentro da ideia de quatro estados da realidade, cada um correspondente a uma letra do impronunciável nome de Deus יהוה - Yod Heh Vau Heh. São eles:
Atziluth (Yod):
Mundo Arquetípico. É o estado mais “puro” da existência, onde a Divindade existe com perfeita união entre suas polaridades. Pura energia de consciência - um dínamo de felicidade suprema. Corresponde ao elemento Fogo.
Briah (Heh inicial):
Mundo Criativo: de onde vêm as inspirações. Corresponde ao elemento Água.
Yetzirah (Vau):
Mundo Formativo/Anjos. Tudo o que pode ser concebido pela mente se forma aqui. Corresponde ao elemento Ar.
Assiah (Heh final):
O Mundo Material, onde a inspiração divina, depois de descer pelos planos, toma forma concreta. Por outro lado, por isso mesmo, é o plano em que o Divino se encontra mais oculto. Corresponde ao elemento Terra.
É dentro destes quatro mundos que ocorrem as Sephiroth, ou Emanações em que a Divindade se expressa. São dez níveis de existência que tornam manifestos os poderes divinos da energia criativa.
As Sephiroth são arranjadas dentro do esquema da Árvore da Vida.
Árvore da Vida: O Mapa da Realidade Manifesta num Glifo Qabbalístico
Uma característica importante deste glifo é que cada parte tem uma relação com as outras partes ao seu redor, sendo o todo maior que sua soma. Estudá-lo está longe de ser um processo linear. De fato, você vai se pegar indo e voltando na Árvore da Vida, cada vez traçando seus passos de uma maneira diferente.
Outro detalhe relevante que se apresenta é a existência de três pilares na Árvore da Vida: o da Severidade, à esquerdas, encabeçado pela esfera de Saturno, Binah; o da Misericórdia, à esquerda, encabeçado por Chokmah, e o do Meio, presidido por Kether. Aí já temos uma representação das polaridades da realidade, bem como de seu encontro no meio.
Eu apresentarei as Sephiroth da mais sutil - Kether - à mais densa - Malkuth. O oposto também funcionaria. Por exemplo: a qualidade de cada Sephira depende de sua posição, de maneira que cada uma é receptiva, ou negativa, à Sephira precedente e projetora, ou positiva, para a Sephira que a sucede.

As cadeias da manifestação começam com Kether.
Kether (A Coroa)
Kether, ocupando o topo do Pilar do Meio, é a coagulação de seus véus: Ain, ou Negatividade, Ain Soph, ou o Ilimitado, e Ain Soph Aur, ou Luz Ilimitada. Repare que Kether é a coroa, e não a cabeça. Isso porque representa um estado tão puro de existência que nela não há forma. Como diz Fortune: Kether é a Malkuth do Imanifesto. Kether é do nosso Cosmos, mas não está nele. Não é manifesta mas é a causa da manifestação. Trata-se, ainda, da fonte dos elementos. Relaciona-se ao Primum Mobile, à Esfera Primordial da existência dos céus. Trata-se, em suma, da forma mais pura de existência, sendo a origem de todas as manifestações canalizadas pelas outras Sephiroth.
Chokmah (Sabedoria)
Ocupando o topo do Pilar da Misericórdia, Chokmah opera como um canal para a força primordial de Kether. Não se trata de uma Sephira organizadora, mas sim do Grande Estimulador cósmico. É desta Sephira que Binah, a próxima na ordem, recebe energia para a ela dar forma. São, portanto, o Masculino e o Feminino primordiais, sendo deste par de opostos primários que se originam os pilares do Universo, por entre os quais é tecida a teia da Manifestação. Algumas imagens relacionadas a esta Sephira são a torre, o bastão erguido e o falo ereto. Chokmah é tanto a Palavra criativa que declarou “que haja a luz” quanto o lingam de Shiva. Chokmah é a mais abstrata forma de força. Relaciona-se ao Zodíaco.
Binah (Compreensão)
Ocupando o topo do Pilar da Severidade, Binah representa a potência feminina do Universo, da mesma maneira que Chokmah representa a masculina. Onde este é Força, aquela é Forma. Binah é o estado em que estresses que interagem entre si se tornam estáveis - pense num átomo, a um só tempo matéria e energia, uma nuvem de elétrons e o bloco primordial da matéria concreta. A coisa sobre tomar uma forma, entretanto, é que o movimento se trata do começo da morte da vida pura e ilimitada, ainda que desorganizada, que encontramos nas Sephiroth precedentes. O espírito incorpóreo é imortal, pois é incapaz de envelhecer e morrer. O espírito corporificado, por outro lado, nasce para morrer - coerente, pois esta é a esfera de Saturno.
Embora todas as Sephiroth existam em todos os quatro planos da existência, é importante notar que, paradoxalmente, o triângulo superior existe em Atziluth, mundo dos Arquétipos. As três primeiras Sephiroth são, de fato, ideais. A seguir, estudaremos o triângulo de Briah, o Mundo Criativo, separado de Atziluth pelo Abismo.
Chesed (Misericórdia)
Ocupando o meio do Pilar da Misericórdia, Chesed é o pai protetor. Continua o trabalho de Chokmah, organizando e preservando aquilo que o Pai de Todos criou. Além disso, equilibra com misericórdia a severidade de Geburah. A Sephira engloba a capacidade visionária de planejar o crescimento antes mesmo de o primeiro bloco ser posto. Isto porque é capaz de enxergar as formas arquetípicas por trás dos símbolos. Trata-se, portanto, da esfera da formulação da ideia arquetípica, da compreensão pela mente consciente de um conceito abstrato que é descido através dos planos e tornado concreto. Corresponde a Júpiter.
Geburah (Severidade)
Reza a lenda que de Geburah vazou o mal primordial que deu origem às Qliphoth, ou anti-Sephiroth. Isso pode ser verdade, mas Geburah também representa o braço forte que defende e garante que se faça justiça. Trata-se de uma força disciplinadora, aquela, que inspira um medo saudável nos corações dos homens. Ocupando o meio do Pilar da Severidade, representa o princípio catabólico, ou destruidor, em contraste com Chesed, que representa o princípio anabólico. Também corresponde ao Cirurgião Cósmico e à energia dinâmica que catalisa a nossa sociedade. Geburah é como o carvão no altar que transmuta sacrifícios nele depositados. Corresponde a Marte.
Tiphareth (Beleza)
Localizada no meio do Pilar do Equilíbrio, é o centro de equilíbrio de toda a Árvore da Vida, além de ser o ponto de transmutação entre os Planos da Forma e os Planos da Força. É Kether num arco inferior e Yesod num arco superior. Trata-se, ainda, da intermediária entre Chesed e Geburah. Em Tiphareth, ideais arquetípicos são focalizados e transmutados em ideias arquetípicas. Se Kether é o Pai, Tiphareth é o Filho e Yesod, o Espírito Santo. De fato, é uma esfera relacionada a deidades sacrificiais, como Cristo. Isto porque, quando Deus se manifesta na forma de seu Filho, ou seja, o Deus que anda entre nós, este deve ser perfeitamente equilibrado. Entretanto, a esfera não só se relaciona a deuses sacrificiais, mas também aos extáticos, como Dioniso, pois de Tiphareth vem a Iluminação. Afinal, sem sua intermediação com os planos inferiores, a fagulha divina é só um flash cegante e sem sentido - que, entretanto, convence a existência de algo a mais. Esfera do Daimon. Corresponde ao Sol.
Passamos agora às quatro Sephiroth inferiores, correspondentes ao plano da forma. A seguir, a tríade de Yetzirah, o Plano Formativo.
Netzach (Vitória)
Localizada na base do Pilar da Misericórdia, Netzach opera como um dínamo com Hod, aquela representando os instintos e emoções e esta, o intelecto e a mente concreta. Netzach é a mente coletiva, ao passo que Hod, a individual. Sendo a Esfera de Vênus, é onde se emprega a arte e a dança para se comunicar com seus anjos. Sendo Hod a esfera da operação mágica, Netzach se faz necessária na medida em que é por meio do instinto e da emoção que a forma criada em Hod ganha alma e tração mágica. Netzach é sobre inspiração mental e artística. Sua operação é indissociável da de Hod.
Hod (Glória)
Localizada na base do Pilar da Severidade, a Sephira Hod representa o princípio da coagulação. É a primeira esfera em que as formas são definitivamente organizadas, com a radiância do Primordial sendo revelada de forma inteligível à consciência humana. É a esfera da transubstanciação, em que a forma astral é animada pelas forças da Natureza, e esta toma forma compreensível. Hod é a Esfera da Magia, sendo a esfera em que opera o magista, pois sua mente cria as formas e sua Vontade faz a conexão com as forças animadoras de Netzach. A iniciação de Hod é onde aquilo que previamente se encontrava inconsciente se torna consciente, trazendo para sob o controle da vontade, sob direção da inteligência superior, as capacidades reativas que antes apenas respondiam cegamente a estímulos. O iniciado de Hod vê além das aparências, pois compreende que são manifestações do Criador. Percebendo o esplendor da Natureza como os trajes do Inefável, ele se torna co-criador com o Grande Artífice. Corresponde a Mercúrio.
Yesod (Fundação)
Ocupando a terceira posição no Pilar do Equilíbrio, Yesod tem afinidade com o plano astral e com o inconsciente. Todas as formas que existem no nosso plano passam primeiro por Yesod. Tal como a Lua, seu astro, Yesod recebe as emanações de todas as outras Sephiroth e, sozinha, as transmite a Malkuth, onde se encontra a Terra. Por isso mesmo, assim como a Lua, essa esfera é tremendamente importante em trabalhos mágicos visando a resultados concretos no plano material. Além disso, é a primeira esfera com que o adepto se familiariza ao começar a subir ao longo das esferas. Assim como a Lua reflete a luz do Sol, Yesod intermedia a transmissão da luz de Tiphareth.
Malkuth (Reino)
Ao contrário das demais Sephiroth, Malkuth não ocupa uma tríade, mas reina solitária em Assiah, na base da Árvore da Vida. Representa os quatro elementos, sendo que a Terra, por exemplo, se encontra no elemento Terra da Sephira. Malkuth, essencialmente a Esfera da Forma, depende das funções de Yesod, ao passo que Yesod, sendo uma esfera que dá a forma, depende, para a manifestação de suas atividades, da substância provida por Malkuth.
A lição de Malkuth, parada final da Árvore da Vida, é que não adianta tentar evitar as demandas do plano material, mas sim encará-las com disciplina. Toda operação mágica deve passar por Malkuth, pois somente então a força se concretiza em forma. Binah é a Mãe Superior e Malkuth, a Mãe Inferior - isto porque aquela é a doadora primordial da forma e esta, a Esfera da Forma. Além disso, polariza com Kether, sendo esta o Pai de Tudo ao passo que aquela é a Grande Mãe.
"Matéria" vem de mater. Na esfera de Malkuth ocorrem todas as divinações, que consistem de usar uma âncora física para compreender os estados do plano astral. Além disso, em todo trabalho mágico onde se visa a manifestação concreta, é necessário ancorar o trabalho mágico com ações concretas.
Exercício prático: Coagula com a Qabbalah
Agora que você já sabe mais sobre as Esferas arquetípicas que constituem a realidade, eu proponho um exercício para você ver como isso funciona na prática e, se correr tudo bem, obter resultados concretos.
O que nós vamos fazer é usar o poder da palavra para coagular algo desejável depois de toda aquela depuração da sombra.
Para isso, você começa escolhendo um tema sombrio que você já trabalhou, por exemplo: fracasso profissional. E então, você vai escrever uma frase que represente o oposto arquetípico deste tema sombrio - no caso, sucesso profissional.
Sua frase provavelmente vai ser algo como “Eu ganho a partir de X reais por mês fazendo o que eu amo e faço bem.” É importante que esta frase queira dizer exatamente o que você deseja. Para garantir, tente interpretá-la como um gênio da lâmpada malicioso, que está obrigado a cumprir suas palavras mas não necessariamente a te dar o que você quer. A magia das palavras deve ser empunhada com sabedoria.
Quando você estiver satisfeito com sua frase, entre em estado meditativo. A esta altura, se você realmente andou praticando, você provavelmente já sabe identificar o ponto ideal de relaxamento que aumenta a porosidade entre o consciente e o inconsciente.
É aí que você começa a repetir sua frase - de preferência em voz alta, mas se as circunstâncias o proibirem, faça-o com sua voz mental. Mas não apenas fale. Sinta a emoção, como se aquilo que você estivesse falando já fosse verdade. Se você conseguir, adicione uma visualização com elementos sensoriais. Neste caso, se imagine no seu ambiente de trabalho ideal, converse com seus clientes dos sonhos, sinta os aromas do lugar e as notas de cem na sua mão.
É possível que esse exercício traga desconforto. Se isso acontecer, é hora de reverter ao trabalho de sombra. Pause por um momento e se concentre na sensação incômoda da maneira sensorial e lúdica que já discutimos. Pode ser até o caso de fazer um inventário do medo mais profundo. Encare isso como uma oportunidade de se aprofundar no trabalho de sombra, que é uma coisa que se faz por toda uma vida.
Encerre o exercício quando você sentir que é hora. Idealmente, repita diariamente, mas, se não for possível, faça-o com a maior frequência possível.
Atesto e dou fé que funciona.
Leituras recomendadas:
A Qabbalah Mística - Dion Fortune
Chicken Qabbalah - Lon Milo DuQuette
Qabbalah, Qliphoth e Magia Goetia - Thomas Karlsson




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